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mel Tupyguá: de preservação à alta culinária pelos povos indígenas

equipe indígenas tupyguá
mel Tupyguá de abelhas nativas

Viscoso, de coloração alaranjada a escura e sabor doce com ligeira sensação acre. Esse é o mel tal como conhecemos. Produto alimentício singular com alta fonte de energia, o mel já era fabricado pelas abelhas e consumido pelos seres humanos há mais de 9 mil anos. Hoje, são encontradas no Brasil mais de 1.500 espécies de abelhas, sendo mais comum a Apil mellifera, a famosa abelha com ferrão, trazida da Europa ao Brasil para a produção de mel. No entanto, há destaque para as mais de 300 espécies sem ferrão, que também são conhecidas como abelhas indígenas ou nativas

Essas abelhas nativas, porém, estão ameaçadas de extinção em virtude do avanço das monoculturas e, especialmente, pela busca da maximização da produção do mel. Muitos produtores, visando maior produtividade, optam pelas abelhas com ferrão, as quais tem grande facilidade enxamear, tolerância a doenças e adaptação a climas mais frios. 

O grande problema da introdução destas é a não adaptatividade natural, sendo boa parte das espécies com ferrão consideradas exóticas-invasoras, como a abelha africanizada (resultado de cruzamentos entre a Abelha-Africana e raças europeias). O risco de uma competição entre elas, colocando as brasileiras em risco de extinção, já é uma realidade. Em paralelo, por não terem sido adaptadas ao bioma brasileiro, as abelhas com ferrão tendem a não possuir capacidade de polinização da flora local e ainda pode causar malefícios a outros animais como, por exemplo, ao fazer colmeias em ninhos de aves. 

As espécies nativas, além de não serem uma ameaça aos seres humanos pela ausência do ferrão, impactam positivamente na biodiversidade brasileira, uma vez que possuem maior capacidade de polinização por estarem adaptadas ao ecossistema local. De acordo com a comunidade científica, em especial informações divulgadas no Jornal da USP, cerca de 90% das espécies de árvores da Mata Atlântica dependem das abelhas nativas sem ferrão para que possam se reproduzir, porque apenas elas podem realizar a polinização. Sendo assim, nessa equação sustentável, quanto mais abelhas nativas presentes no meio ambiente, mais plantas são polinizadas que, consequentemente, preservam e mantém a fauna e flora. 

são diversas espécies que fazem parte do fascinante mundo das abelhas sem ferrão. mas uma delas, a abelha Uruçu-amarela, merece destaque pelo seu protagonismo na geração de renda e produção sustentável de mel nas comunidades indígenas de Aracruz, no Espírito Santo. fundada em 2018, a COOPYGUÁ, Cooperativa de Agricultores Indígenas Tupiniquim e Guarani, se compromete na produção de mel saboroso e de alta qualidade com o manejo consciente e equilibrado da uruçu-amarela.

Uma região de 12 mil hectares na zona costeira capixaba, o território é marcado com uma história de exploração desde a chegada dos portugueses no século XVI até os dias de hoje. Mas a resistência das tradições do povo Tupiniquim e Guarani da Coopyguá, reacendem a esperança da preservação da biodiversidade da Mata Atlântica e garante geração de renda para as famílias indígenas locais. Além disso, os produtos Tupyguá permitem, sobretudo, a divulgação e preservação da história e saberes populares dos povos originários que habitam  nossa terra há milhares de anos.

para Jefferson, indígena Tupiniquim e cooperado da Coopyguá, a formalização da atividade com a criação de uma pequena agroindústria, criação de marca e expansão do comércio fez com que a cooperativa tivesse importância notável no Brasil. 

‘’Se a gente parar para pensar, existem poucas coisas que são produzidas por descendentes indígenas, que têm reconhecimento no mercado. Só de termos quebrado essa barreira, de ter colocado uma coisa que é da nossa terra, feita pelas nossas mãos, disponível para todo o país, já vale muito”, explica.

além disso, o mel nativo Tupyguá vem conquistando paladares do país inteiro. alguns restaurantes renomados como o Soeta, no Espírito Santo, o DOM, em São Paulo e o Manu, no Paraná usam em suas receitas esse mel. segundo Alex Atala, o chef do DOM, o mel das abelhas sem ferrão faz bem para toda a cadeia e valoriza a diversidade dos biomas brasileirios. “a gastronomia brasileira ganha muito por ter em mãos produtos de sabor tão rico, complexo e versátil”, conta Atala.

Atualmente a cooperativa comercializa três tipos de mel, de acordo com a vegetação de onde são produzidos: Tabuleiro, Capoeira e Restinga, além da cera e o pólen, subprodutos do mel. O objetivo no médio prazo é comercializar outros produtos que fazem parte da cultura dos povos originários da região, como: farinhas de mandioca, urucum, pimenta do reino e polpas de frutas.

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